Gestão da água e produção de café
Como um recurso cada vez mais escasso, a disponibilidade de água, é uma questão urgente enfrentada pelos produtores de café. No entanto, como diz a Specialty Coffee Association, “a forma como o café é produzido e processado pode ser parte da solução para a crise de água ou do problema.”
Embora o café Arábica esteja mais presente em florestas biodiversificadas, onde os ciclos de água são naturalmente regulados, este tipo exato de ambiente (ou uma réplica dele, através do cultivo de café sob a sombra) não está disponível em qualquer lugar ou tamanho de fazendas.
Para os produtores que cultivam café ao sol, os esforços deliberados de gestão da água irão ajudar as plantas a permanecerem saudáveis, para que as suas cerejas possam atingir todo o seu potencial. Eis como os produtores podem proteger os seus recursos hídricos e otimizar a sua utilização enquanto fazem o que há de melhor para as suas culturas.
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O alto custo da produção de café
De acordo com um estudo realizado pelo IHE Delft Institute for Water Education (a maior instalação internacional de graduação no ensino sobre água do mundo), são necessários cerca de 140 litros de água para produzir uma xícara de café de 125 ml.
O estudo explica que, embora a quantidade de água utilizada varie de acordo com a utilização da produção úmida ou seca, a maior parte é utilizada durante a fase de crescimento da planta. Também vale a pena notar que, dependendo do clima, da geografia e de outros fatores, essa quantidade de consumo pode mudar.
Os ambientes de crescimento ideais para o cultivo de Arábica podem incluir regiões subtropicais que vivenciam estações úmidas e secas bem definidas, ou regiões equatoriais que experimentam chuvas frequentes. No entanto, as alterações climáticas estão impactando muitas destas áreas, e a seca é uma grande pressão ambiental que afeta a produção na maioria dos países.
Como a produção com cultivo ao sol pode resultar em maiores volumes de café, esta é uma solução popular, proposta para fazendas não lucrativas. Entretanto, vem com um custo, como acontece com muitos dos benefícios do café cultivado à sombra. Cada vez mais, o café especial está sendo proveniente de plantações irrigadas, onde suplementos de água são somados à chuva durante as estações secas.
O Brasil é um dos maiores produtores e exportadores de café do mundo, e a maior parte do seu café é cultivado ao sol. Falei com dois produtores brasileiros de café especial em Minas Gerais, o maior estado cafeeiro do Brasil, que representa quase metade da produção do país. Eis o que eles tinham a dizer sobre como lidar com a conservação e garantir colheitas saudáveis.
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O papel das linhas de gotejamento e do monitoramento
Juliana Armelin e seu marido Paulo Siqueira administram a Fazenda Terra Alta, localizada em Ibiá, no Cerrado brasileiro. Sua plantação de 520 acres produz cerca de 11.000 sacas de grãos por ano. O casal adotou muitas práticas para reduzir seu impacto ambiental, incluindo um sistema de irrigação por gotejamento subsuperficial para reduzir o desperdício de água e fertilizantes.
A fazenda foi fundada em 2010, onde antes existia um rancho de gado, o que significa que seu solo estava em más condições e as nascentes naturais abandonadas. Como diz Juliana, é “fundamental cuidar das nascentes de água e dos rios nas propriedades … Fizemos um grande esforço para corrigir e monitorar a erosão em áreas de risco e plantar árvores nativas.”
O sistema de nutrição e irrigação por linha de gotejamento subsuperficial da Fazenda Terra Alta evita o desperdício de água provendo uma quantidade controlada de água na base de cada planta. A concentração na base significa que a maior parte da água vai para baixo da terra, evitando evaporação e fugas desnecessárias. As linhas também são usadas para distribuir fertilizante.
A quantidade de água disponível para as plantas determina quando e quanta irrigação é necessária, e para que isso ocorra, o teor de umidade do solo deve ser medido. Quando os poros do solo estão completamente saturados com água, a tensão terra-água deve ser zero.
A Fazenda Terra Alta usa leitores de balanço hídrico em toda a fazenda. “As medições de tensão … nos dá uma ideia mais precisa da quantidade de água disponível no solo … Além disso, temos uma estação meteorológica que fornece os dados de chuva e de transpiração por evaporação. Com todos esses dados, analisamos diariamente as plantas durante a estação seca, para garantir que a quantidade de água seja satisfatória.”
Aplicação de irrigação suplementar
Em seguida, falei com Marcelo Flanzer, fundador e diretor da Ecoagrícola na Serra do Cabral, Minas Gerais. Em sua fazenda, a irrigação de pivô é usada. Esse equipamento gira em torno de um pivô central, molhando a plantação com borrifadores em um padrão circular. Este método usa menos água do que outras formas de irrigação.
O equipamento utiliza tecnologia de aplicação de precisão de baixo consumo especializada para garantir que a água chegue diretamente ao sulco, mantendo o dossel da planta seco. Além disso, utilizam um sistema de agricultura de precisão que, com a ajuda de monitoramento GPS, garante que cada planta receba a quantidade perfeita de água e de nutrientes.
Marcelo diz que “embora nossa região tenha muita chuva, entendemos que a irrigação … [proporciona] mais segurança (durante as semanas em que a chuva não é regular) [e] aumenta a produtividade. Temos a sorte de ter … muitos riachos onde podemos capturar e armazenar água com baixa pressão de retorno”.
Ele acrescenta: “Temos uma estação de medição automática que lê dados pluviométricos, radiação solar, temperatura e dá taxas diárias de evapotranspiração, mostrando quantos milímetros [de água] são necessários …”.
O sistema de irrigação é alimentado por um reservatório que Marcelo construiu no ponto mais alto da fazenda. Ele diz: “Bombeamos a água para o reservatório à noite quando as taxas de energia são mais baratas. Quando chega a hora de irrigar, a água desce com a ajuda da gravidade, poupando muita energia.”
Marcelo usa o estresse hídrico (deixar a planta sem água por longos períodos) a seu favor. Ele conta que o início da colheita coincide com a estação de seca na região, de Maio a Setembro. Ele diz que “não usamos água por aproximadamente 90 dias. Isto ajuda a planta a ter um florescimento mais uniforme, resultando em uma maturação mais homogênea e café de melhor qualidade”.
Conselhos práticos de gestão para os produtores
Embora fazendas como a Ecoagrícola e a Fazenda Terra Alta operem em maior escala do que muitos produtores de café, existem formas de implementar práticas de gestão da água em escala menor e mais acessível. Aqui estão algumas maneiras de se fazer isto.
- Pesquise sobre a área onde você pretende em plantar seu café. Escolha locais com boa drenagem e solo poroso, onde o risco de danos por inundação é mínimo. As áreas com vegetação saudável existentes são preferíveis, uma vez que protegerão o solo de chuvas intensas. As regiões com áreas abertas são mais propensas a sofrer danos por erosão e inundações repentinas.
- Mantenha o solo saudável, uma vez que o solo com alto nível de macro e micro nutrientes retém e absorve melhor a água. Se trata de equilíbrio, quando se dá a uma planta mais do que ela necessita, ela exigirá mais água. Como os nutrientes, a água e o oxigênio são absorvidos através das raízes, a chave para obter qualidade e rendimentos máximos é um solo bem equilibrado e uma umidade adequada.
- Plantar árvores para seu efeito regulatório natural. Suas raízes profundas ajudarão o solo absorver e manter os níveis de umidade apropriados. Escolha uma espécie nativa, de modo que faça parte do apoio ao ecossistema local.
- Considere a cultura intercalar, pois ela promove um solo saudável e oferece a cobertura de sombra. Essa técnica também pode ajudar a regular a umidade.
- Se sua fazenda fica em uma colina, plante horizontalmente em fileiras ao longo da inclinação, em vez de verticalmente, para retardar o fluxo de águas subterrâneas e ajudar a evitar erosão.
- Utilize a cobertura do solo para melhorar sua estrutura, adicionar material orgânico e reter a umidade. Isto será útil em áreas que talvez recebem muita água ou que sejam propensas a inundações durante estações chuvosas.
- Reconhecer sinais de estresse hídrico, como folhas que murcham no horário mais quente do dia, durante as estações secas. Um longo período com falta de água pode impedir o desenvolvimento de açúcares nas cerejas, deixando as plantas mais suscetíveis a doenças, explica Juliana.
- Acompanhe os dados relevantes. Marcelo recomenda verificar com especialistas locais sobre as tabelas de água da região, bem como “coletar dados climáticos diários … utilize o conhecimento disponível para evitar o desperdício de água”. Algumas faculdades ou o departamento de agricultura do governo podem ter recursos úteis.
A escassez de água é um problema que está aqui para ficar, e que os produtores não podem se dar ao luxo de ignorar.
Enquanto climas diferentes e fazendas de café experimentarão diferentes níveis de seca e escassez de água, colocar em ação um plano proativo de gerenciamento de água, antes que as condições piorem, irá garantir que sua fazenda esteja preparada para qualquer eventualidade que possa surgir no futuro.
Traduzido por Daniela Melfi
Crédito das imagens: Ecoagrícola
PDG Brasil
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