O que é Maragogipe e qual é o mercado para essa variedade?
Dentro do mercado de cafés especiais, há um número crescente de espécies e variedades de café mais exclusivas e altamente valorizadas, como a Gesha e a Maragogipe. Esta última é uma variação natural da Typica, e produz cerejas e grãos muito grandes. o que acaba impactando no processamento e na torra.
Espécies e variedades raras de café podem se tornar mais reverenciadas por várias razões, incluindo sua alta qualidade de xícara e perfis sensoriais desejáveis. No entanto, algumas variedades também são procuradas devido a suas características físicas incomuns, como o tamanho grande do grão.
Para saber mais sobre Maragogipe, bem como se existe um mercado mais amplo para essa variedade, conversei com três profissionais do café. Leia para descobrir mais.
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De onde vem o Maragogipe?
Segundo a World Coffee Research, a variedade foi descoberta em 1870 no município de Maragogipe, na Bahia, nordeste do Brasil – daí seu nome.
Como resultado de seu único gene dominante, Maragogipe produz folhas, cerejas e grãos extraordinariamente grandes – o que levou muitos profissionais do café a chamá-lo de “grão elefante”.
Os pesquisadores também concluíram que Maragogipe é uma espécie-mãe, dando origem às variedades Pacamara e Maracaturra, que também produzem grãos enormes. Enquanto o último se originou da Nicarágua, o primeiro cresce principalmente em El Salvador, onde frequentemente recebe altas pontuações nas competições anuais da Cup of Excellence.
Gerson Silva Giomo é pesquisador científico do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) no Brasil. Ele explica que até a década de 1950 era comum encontrar um pequeno número de plantas de maragogipe crescendo em algumas das principais regiões cafeeiras do Brasil. “Devido ao seu baixo rendimento, essa variedade não foi cultivada em escala comercial”, diz.
Embora a qualidade potencial da Maragogipe seja muito alta quando cultivada em altitudes elevadas, seu potencial de rendimento não é. Além disso, Maragogipe também é altamente suscetível a várias pragas e doenças.
Mauricio Salvaverra é produtor da Divisadero Coffee em El Salvador. Segundo ele, antes dos anos 1950 e 1960 mais fazendas em El Salvador costumavam cultivar Maragogipe. “No entanto, devido a seus baixos rendimentos e suscetibilidade à la roya (ferrugem da folha do café), mais agricultores começaram a cultivar Bourbon e Pacamara”, diz.
Declínios na produção
Gerson conta que por sua produção render menos, muitos agricultores no Brasil começaram a substituir Maragogipe por variedades mais produtivas, como Mundo Novo. “Hoje, a produção de Maragogipe no Brasil é limitada a um pequeno número de fazendas que atendem a clientes que procuram grãos de tamanho maior”, diz.
Apesar dos desafios associados à sua produção, as características únicas da variedade a tornaram mais popular em vários países de origem. Estes incluem México, Guatemala, Nicarágua, El Salvador, Colômbia e Havaí.
Como processar e torrar grãos de Maragogipe?
Quando se trata de processamento e torra, o tamanho do grão é certamente um fator importante. No entanto, é especialmente relevante para variedades que produzem grãos grandes, como Maragogipe.
“De modo geral, os métodos naturais de processamento ajudam a melhorar a complexidade, a doçura e o corpo da variedade, além de destacar sabores mais frutados. Por outro lado, com técnicas de processamento lavado, a Maragogipe é menos doce e com um corpo leve. Mas é possível melhorar os aromas ácidos e florais”, Gerson explica.
Brandon von Damitz é sócio da Big Island Coffee Roasters no Havaí, que cultiva um Ka’ū Maragogipe de 94 pontos com notas de pêssego, bergamota e mel. Ele diz que o potencial da variedade está em quão bem ela responde ao seu terroir, às práticas agrícolas, ao método de processamento, perfil de torra e método de extração.
“O que eu amo no Maragogipe cultivado no Havaí é que ele é de alta qualidade e versátil. A variedade funciona bem com uma série de perfis de torra e métodos de preparo. O tamanho dos grãos, bem como seus outros atributos, determinam como devemos aplicar o calor ao torrar”, afirma.
Mauricio menciona que, como a Maragogipe possui propriedades sensoriais tão desejáveis, os produtores costumam vendê-lo como um micro ou nano lote de origem única. Ele acrescenta que alguns produtores também usam técnicas de processamento de mel, ou mesmo métodos de fermentação controlada.
“Alguns torrefadores dizem que não é a variedade mais fácil de torrar”, diz ele. “No entanto, tenho clientes na Austrália, França e EUA que certamente comprariam mais Maragogipe se tivéssemos mais disponível.” Brandon concorda, dizendo: “Dada a sua raridade e baixos rendimentos, preferimos vender e comercializar a Maragogipe como origem única, em vez de em blends.”
Como é o sabor do café maragogipe?
Tal como acontece com qualquer variedade, o perfil de sabor e os atributos sensoriais são naturalmente resultados do terroir da planta. Isso inclui o solo, o clima, a altitude e a região em que o café cresce. Além disso, os métodos de processamento pós-colheita também têm um impacto significativo no perfil da xícara de café.
É justo dizer que, ao longo dos anos, as opiniões sobre a qualidade de Maragogipe variaram muito. Por exemplo, no livro de William Ukers, All About Coffee, que foi publicado pela primeira vez em 1922, ele afirma: “O grão verde é enorme e sua coloração varia de verde a marrom escuro. É o maior de todos os grãos de café, mas amadeirado e geralmente desagradável na xícara.”
No entanto, muitos profissionais do café concordam que, com as melhores práticas agrícolas, Maragogipe pode produzir café de alta qualidade com características desejáveis. “Normalmente, Maragogipe é naturalmente muito doce e com baixa acidez”, explica Gerson. “Também tem algumas nuances florais, bem como notas de degustação de mel e às vezes especiarias.”
Brandon concorda, dizendo: “Adoro as qualidades dinâmicas de sabor e aroma doce da Maragogipe. Notas de pêssego com alguns tons de chocolate, bem como algumas mais herbáceas de lúpulo e sândalo. A experiência sensorial pode mudar no dia-a-dia, bem como ao usar diferentes métodos de preparo, havendo muito para desfrutar de um único café.”
Como é o mercado para esta variedade?
Sem dúvida, Maragogipe é uma escolha popular entre os torrefadores de cafés especiais que vendem variedades mais exclusivas. Mauricio diz que cultiva Maragogipe há quase uma década e vende o café como parte da gama de nano lotes da Divisadero.
“O tamanho do grão da variedade e a grande qualidade da xícara geralmente rivalizam com o de Pacamara em El Salvador”, explica ele. “No entanto, porque Maragogipe é caro para produzir, muito poucos agricultores estão interessados em plantar mais, e os preços de mercado permanecem muito altos.”
Enquanto Maragogipe não é considerada uma variedade ultra exclusiva, Brandon diz que pode ser difícil para os consumidores encontrarem. “Temos a sorte de ela crescer no Havaí, onde podemos experimentar diferentes regiões de cultivo e métodos de processamento para criar experiências sensoriais ainda mais diversas e únicas”, afirma.
Brandon acrescenta que quando a Big Island Coffee Roasters vendeu pela primeira vez Maragogipe, era notavelmente muito popular entre seus clientes – indicando haver uma demanda crescente. “A combinação de sua raridade, tamanho e perfil de sabor significa que é um café único que as pessoas querem conhecer. Quando esgota, desaparece até a próxima safra”, explica
Gerson me conta que o IAC estuda Maragogipe desde 1931, com foco específico na modificação genética para melhorar o rendimento. “Sabendo que no mercado de cafés especiais há uma demanda crescente por variedades que produzem grãos maiores, o IAC preservou diversas plantas femininas do Maragogipe Vermelho e Amarelo em seu banco para uso futuro”, explica.
“Para aumentar a produtividade, o IAC desenvolveu protocolos específicos para a produção comercial de Maragogipe”, acrescenta. “Isso inclui um foco particular na definição do melhor espaçamento entre plantas, nutrição e manejo fitossanitário (garantindo que as plantas estejam livres de pragas e doenças perigosas).”
Existe potencial para melhorar a produtividade da safra?
Embora existam desafios claros quando se trata da produção de Maragogipe, Gerson espera que ela possa se tornar mais difundida. “Com base na seleção da linhagem Maragogipe do IAC, bem como na aplicação das melhores práticas agrícolas e de processamento pós-colheita, a produção dessa variedade poderia aumentar no Brasil”, explica.
Brandon também está otimista sobre o futuro da variedade no mercado de cafés especiais. “As qualidades da xícara de Maragogipe são mais adequadas para consumidores mais aventureiros e geralmente com paladares mais desenvolvidos É um ponto de entrada fantástico para pessoas que querem experimentar o que diferentes variedades de café têm a oferecer”, afirma.
É claro que o café especial dá muito valor a variedades mais exclusivas e altamente valorizadas e os produtores e torrefadores que vendem Maragogipe certamente podem capitalizar isso.
No entanto, ao mesmo tempo, a baixa produtividade da variedade e a vulnerabilidade a pragas e doenças representam um número significativo de desafios para a produção em escala.
Portanto, se quisermos ver mais Maragogipe disponível no futuro, é certamente necessário mais pesquisas e amplo apoio aos produtores de café.
Gostou? Então leia nosso artigo sobre variedades de café: um curso intensivo em Gesha e Bourbon.
Créditos das fotos: Gerson Silva Giomo, IAC, Juleigh Burden, Kelleigh Stewart
PDG Brasil
Traduzido por Daniela Melfi
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