Elasticidade-preço da demanda: O que aconteceria se o café ficasse mais caro?
Quanto você pagaria por uma xícara de café?
Se um café coado custasse o mesmo que um copo de uísque, você o beberia com a mesma frequência? Se um pacote de café custasse o dobro do que custa agora você ainda compraria no mesmo ritmo? Você estaria disposto a gastar menos em outras coisas para poder comprar um café?
Em economia, a forma como o comportamento de compra muda com base nas alterações de preço é chamada de “elasticidade-preço da demanda”. No setor cafeeiro, a fixação de preços é uma questão controversa e bastante discutida. O chamado “preço C” afeta agricultores, comerciantes e torrefadores em todo o mundo.
Muitos argumentam que os cafeicultores precisam receber valores mais altos para deixar de viver de subsistência e tornar suas lavouras verdadeiramente sustentáveis. Mas como as mudanças nas políticas de precificação do café afetariam o seu consumo?
Continue lendo para aprender mais sobre a elasticidade-preço da demanda e por que ela é tão importante no setor cafeeiro.
Você também pode gostar de nosso artigo sobre a história inicial do mercado C.
Elasticidade-preço da demanda: primeiras impressões
Em economia, a palavra “elasticidade” é usada para descrever como o comportamento muda devido a uma mudança no contexto.
A elasticidade-preço da demanda é apenas um tipo de elasticidade. Refere-se a quanto mais ou menos de algo as pessoas comprariam se o preço mudasse.
É importante no setor cafeeiro, especialmente para os formuladores de políticas e os principais atores do setor que buscam mudar a maneira como a cadeia de valor do café funciona.
Muitos dos estimados 24 milhões de cafeicultores do mundo enfrentam dificuldades financeiras, com os preços baixos e a volatilidade frequentemente apontados como fatores contribuintes. Embora seja fácil dizer que pagar mais pode resolver o problema, prever como isso influencia as decisões de compra dos consumidores não é simples.
A complexidade dessa tarefa costuma ser subestimada, o que significa que, quando as decisões são tomadas, elas costumam ser baseadas nas suposições que os tomadores de decisão ou especialistas fizeram sobre o comportamento esperado do consumidor.
Infelizmente, porém, essas previsões de “bom senso” costumam ser insuficientes. Em termos gerais, eles serão baseados em evidências comportamentais anteriores e, portanto, serão menos relevantes ou tendenciosos.
Princípios fundamentais
Se aceitarmos que a evidência histórica não é suficiente para prever adequadamente o comportamento futuro do comprador, como você determina o que acontecerá com o comportamento de compra se aumentarmos o preço do café?
Bem, o primeiro passo é entender as relações e os diferentes fatores que influenciam as decisões de compra. Isso nos ajudará a entender as relações de causa e efeito.
Na maioria dos mercados se verifica o que é chamado de “elasticidade-preço negativa da demanda”.
Nela, as pessoas compram mais à medida que o preço baixa e menos à medida em que o produto fica mais caro. A elasticidade é justamente o resultado dessa relação entre a quantidade comprada e as alterações nos preços.
Se uma mudança de preço não causa grandes alterações na demanda, consideramos que ela é inelástica. No entanto, se a demanda é altamente dependente do preço, consideramos que há grande elasticidade.
Com menor elasticidade-preço da demanda, a curva acima fica mais íngreme; com maior elasticidade ela fica mais plana, como você pode ver abaixo.
Utilidade marginal e rendimentos decrescentes
Claro, fica muito mais complicado do que isso. A partir de um gráfico, é fácil dizer que um preço mais baixo poderia aumentar a quantidade demandada a um ponto teoricamente infinito, o que não se aplica na realidade porque simplesmente não existiria produto suficiente para suprir essa demanda
Em primeiro lugar, temos que considerar a lei dos rendimentos decrescentes. Ela está relacionada ao conceito de que as pessoas vão consumir mais de algo quando é mais barato e pressupõe que mais é “melhor”.
Partindo desse princípio, podemos perguntar: dois espressos são melhores do que um? Para as pessoas que gostam dessa bebida, provavelmente podemos dizer que sim. Mas e dez espressos? Depois de duas ou três xícaras a maioria das pessoas provavelmente não vai optar por beber outro, mesmo que fosse de graça.
O quanto um consumidor gosta ou aprecia ter um produto, no caso as doses de espresso, é chamado de “utilidade” do produto e, a partir dessa linha de pensamento, podemos concluir que ela é maior quando se pede a primeira xícara do que na terceira ou na quarta, e assim sucessivamente.
A “dose extra” de satisfação que um comprador passa ter quando tem acesso a mais unidades de algo é chamada de “utilidade marginal”, e para entender como isso influencia a elasticidade-preço da demanda dê uma olhada no gráfico abaixo:
Substitutos: como eles afetam a elasticidade-preço da demanda no café
Outro conceito muito importante ao prever a demanda por um produto é a substituição. A “elasticidade-preço cruzada da demanda” é o quanto a demanda por um produto muda de acordo com o preço de outro que poderia substituí-lo.
Para simplificar: se o café se tornasse extremamente caro, as pessoas poderiam passar a escolher tomar chá. Por outro lado, se o chá ficar muito caro, a demanda por café pode muito bem aumentar.
A disposição dos consumidores em aceitar um substituto para um produto é chamada de “taxa marginal de substituição”.
Se um consumidor se satisfaz da mesma forma ou com pouca variação quando troca o café pelo chá em função do preço, é mais provável que ele faça a troca de um pelo outro.No entanto, isso não ocorre caso os consumidores tenham uma elevada predileção por esse ou aquele produto.
A mesma lógica pode ser aplicada em diferentes segmentos do setor cafeeiro. Se os preços do café especial giram em torno de US$ 15, enquanto os do café tradicional de US$ 10, o consumidor compraria o de melhor qualidade se considerasse que a satisfação que obtém dele é igual ou superior aos 5 dólares de diferença entre os dois tipos.
Há ainda outra pergunta a se fazer nesse sentido: com esse valor da diferença entre os dois produtos, o consumidor poderia comprar algum outro item que lhe traria mais satisfação do que a qualidade do café? Ele ficaria mais satisfeito por beber um café especial ou preferiria pagar por um café tradicional e um sanduíche?
O que a elasticidade-preço da demanda significa para o setor cafeeiro?
Esses vários exemplos ilustram, acima de tudo, que a questão sobre a intenção de pagar mais ou não por seu café não tem uma resposta simples, e que isso sempre depende do contexto.
Mas como esse conhecimento da elasticidade-preço se relaciona com o mundo real? Quais são as implicações para o setor cafeeiro em que vivemos e trabalhamos?
O café, como uma única categoria de produto, é geralmente tido como razoavelmente inelástico em relação ao preço nos mercados consumidores de alta renda, o que pode ser verificado nesse artigo de 2005. Quanto aos mercados de renda mais baixa, infelizmente há menos informações disponíveis.
Também sabemos que o café é uma categoria de produto muito competitiva em muitos mercados consumidores, já que caso o café se tornasse um pouco mais caro em geral seria improvável que os varejistas aumentassem muito os preços finais para os consumidores. Isso porque eles provavelmente passariam a comprar produtos substitutos comparáveis a preços mais baixos.
Já foi visto ainda, historicamente, que em meio a picos de preço os torrefadores aumentam o uso de cafés mais baratos em seus blends, como robustas de grau commodity ou arábicas de pontuação mais baixa. Isso os ajudou equiparar os custos e a evitar o aumento dos preços para o consumidor final, o que tornaria seus produtos menos competitivos.
Caso no. 1: Você poderia aumentar os preços do café para que os produtores ganhem mais dinheiro?
Existem vários argumentos para explicar por que o aumento artificial dos preços no consumidor final levaria ou não aos resultados desejáveis.
Ao examinar as implicações da elasticidade-preço da demanda, conforme mencionado, o aumento teórico dos preços ao consumidor não levaria a uma redução significativa da demanda, assim como não há evidências de uma elevação no preço do varejo resultem um aumento nos preços do café verde.
No entanto, se um aumento no preço do café verde fosse ditado por grupos de produtores, a cadeia de abastecimento posterior (torrefadores e varejistas) e seus clientes teoricamente seriam capazes de absorvê-lo.
Caso no. 2: Podemos promover o consumo nos países produtores de café?
Há um argumento popular de que, se a demanda por café aumentar e a oferta permanecer estável, os preços naturalmente aumentarão. Como a demanda é inelástica ao preço (ou seja, não é sensível ao preço), então, em teoria, o mercado deveria consumir a mesma quantidade, mesmo a preços um pouco mais altos.
Como a maioria dos países importadores de café de alta renda está saturada com as marcas existentes, muitos procuram os países produtores de café para impulsionar uma nova demanda.
Em alguns países produtores que exportam a grande maioria de sua produção e importam café de baixo custo do exterior, temos visto uma pressão para proibir as importações e aumentar a demanda pelo café produzido localmente. Em teoria, isso pressionaria automaticamente os preços para cima.
No entanto, a eficácia dessas medidas dependeria maciçamente da elasticidade-preço da demanda no mercado em questão. Em países de renda mais baixa, as pessoas têm menos renda disponível e um hipotético aumento no preço do café poderia cortar o orçamento de bens e serviços “essenciais”, como alimentação, abrigo e roupas.
Se as pessoas têm dinheiro suficiente para comprar café, leite e pão aos preços atuais e o café fica mais caro, precisamos saber se comprariam menos leite ou pão para beber café. Pão e leite são mais propensos a serem considerados essenciais e, portanto, oferecem mais utilidade, remetendo à ideia de utilidade marginal tendo uma relação com a demanda.
Se uma medida destinada a aumentar a demanda por café produzido internamente fez com que o preço subisse, há uma boa chance de que ela pudesse, inadvertidamente, reduzir a demanda até certo ponto. Isso atenuaria a eficácia da política.
Em última análise, esses são apenas alguns dos muitos fatores a serem levados em consideração ao avaliar medidas que podem alterar ou influenciar o preço do café.
Embora esses conceitos possam ajudar proprietários de empresas, legisladores e produtores a entender o que acontece quando o preço do café muda, a realidade é que eles ainda são muito teóricos. Para realmente entender como o mercado reagirá quando o preço mudar, é importante reunir o máximo de dados possível e realizar todas as análises relevantes.
Gostou? Em seguida, leia nosso artigo sobre como repensar o preço C.
Créditos das fotos: Karl Wienhold, Cedro Alto
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