Os blends estão se tornando mais populares no café especial?
Em todo o universo do café especial, é inegável haver um foco crescente no fornecimento de cafés sustentáveis, rastreáveis e de alta qualidade. Grande parte disso gira em torno da oferta de cafés de origem única, cultivados em um local específico.
Esses cafés, inclusive, costumam ser os preferidos por muitos profissionais de café em suas rotinas de trabalho ou para participação em campeonatos como o WBC e similares. Isso ocorre devido aos perfis de sabor complexos e delicados que possuem.
No entanto, ao longo do ano passado, temos visto mais e mais torrefadores vendendo blends de café de alta pontuação, e mais concorrentes do WCC usando blends em suas apresentações. Então, para entender porque os blends de alta qualidade vêm se tornando cada vez mais populares, falei com dois pesquisadores de café para descobrir mais.
Você também pode gostar do nosso artigo sobre como os blends de cafés especiais evoluíram para o mercado de hoje.
Por que os blends estão se tornando mais populares entre os profissionais de café especial?
Muitos profissionais e apreciadores de cafés gostam dos grãos de origem única. Isso ocorre, em grande parte, porque eles permitem uma maior percepção de suas qualidades inerentes, além de demonstrarem mais nitidamente o resultado do árduo trabalho dos produtores que os cultivam.
No entanto, nos últimos meses, à medida que os custos de transporte aumentaram, como uma série de outros custos operacionais, as margens de lucro dos torrefadores ficaram justas. Como tal, alguns se voltaram para a venda de blends de alta qualidade como uma maneira de controlar os custos.
Há muito tempo que os blends são essenciais nos menus das cafeterias em todo o mundo, oferecendo aos bebedores de café mais tradicionais um perfil de sabor repetível e consistente. E isso pode ajudar uma marca a construir uma base de clientes mais fiel.
Além disso, em teoria, os blends também dão mais flexibilidade aos torrefadores de café. Ao fazer blends de cafés de maior qualidade e mais caros com cafés mais baratos que adicionam mais corpo e sabores mais robustos, os torrefadores ainda podem atrair os consumidores, mantendo os custos baixos sem que necessariamente se reduza o nível de qualidade do produto.
Segundo Daniel Velasquez, da exportadora colombiana Campesino Coffee, à medida em que a demanda por café especial aumentou nos últimos anos, os pedidos de blends de alta qualidade também aumentaram.
“Da mesma forma que o café descafeinado, os blends não precisam ser cafés de baixa qualidade e alto volume e acho que os profissionais do café e os clientes estão finalmente reconhecendo isso”, ele acrescenta. “Nosso blend Madre Laura Community inclui cafés de mais de 120 pequenos produtores em Jericó, Colômbia. Embora esse seja um dos nossos cafés de maior volume, não nos sacrificamos pela qualidade ou rastreabilidade”, conclui.
Fatores a serem considerados na elaboração de blends
Embora existam vários fatores a serem considerados ao criar um blend de café especial, como a sazonalidade e a solubilidade de diferentes cafés, eles permitem que os torrefadores desenvolvam uma experiência sensorial completamente diferente para origens únicas.
De acordo com Philip von der Goltz, sócio da importadora List + Beisler, blends especiais podem ajudar os torrefadores a desenvolver um perfil de sabor específico, com frescor e qualidades do produto mantidos, além dos custos otimizados.
“Os blends podem fornecer flexibilidade a um torrador e diminuir sua dependência de uma determinada origem ou qualidade. Os blends podem ser usados ainda para criar um café mais exclusivo e com melhor sabor do que seria possível de outra forma”, acrescenta.
Com o recente aumento de blends de cafés especiais, também vimos cada vez mais concorrentes dos campeonatos internacionais de cafés usando blends como parte de suas rotinas – principalmente para equilibrar os sabores de novas variedades e espécies emergentes.
Exemplo disso é o vencedor da World Brewers Cup de 2021, Matt Winton. Ele usou um blend de eugenioides (uma espécie rara de café) e Catucaí em sua rotina. Nesse mesmo ano, a competidora do Campeonato Mundial de Baristas de 2021 (WBC) Andrea Allen ficou em segundo lugar, quando usou um blend de eugenioides e Gesha na categoria de café espresso. Hugh Kelly, que ficou em terceiro lugar na WBC 2021, também usou um blend de eugenioides e liberica em sua performance.
O que torna esses blends especiais?
Se um café for certificado como “especial”, não deve ter defeitos primários (como grão preto), e não mais do que cinco defeitos secundários (incluindo grão quebrado), em uma amostra de 300g. O café também deve marcar 80 pontos ou mais na escala de 100 pontos da Specialty Coffee Association.
No entanto, há uma série de outras considerações menos formais para os torrefadores quando eles criam blends. Em primeiro lugar, essas misturas não se limitam apenas a cafés de diferentes origens. Os torrefadores podem incluir variedades e métodos de processamento diferentes ou mesmo usar diversos micro lotes da mesma fazenda.
“Nosso Community Blend, por exemplo, é composto por pequenos lotes que, de outra forma, seriam vendidos como micro lotes premium”, diz Daniel.
Este processo permite que os torrefadores reúnam diferentes cafés de origem única para criar uma xícara mais equilibrada, mantendo perfis de sabor complexos e de qualidade.
Além disso, os blends especiais também garantem que o café ainda possa ser rastreado até a fazenda e o produtor que o cultivou. Cada vez mais as torrefações estão incluindo informações sobre os componentes de seus blends, ajudando a manter a rastreabilidade e a transparência. Em última análise, os blends estão se tornando cada vez mais importantes no setor de café especial.
Os cafés de origem única estão perdendo popularidade?
Em vista do crescimento recente de blends de café especial, há uma grande pergunta pendente: os cafés de origem única estão se tornando menos populares?
Philip diz que algumas tendências recentes na indústria do café especial estão contribuindo para o crescimento de blends de café premium. Segundo ele, alguns blends podem oferecer mais consistência aos clientes, enquanto outros podem criar experiências inéditas de sabor.
Philip diz ainda que os aumentos nos preços do mercado influenciaram os comerciantes de café verde e torrefadores a desenvolver mais blends como uma maneira de oferecer um produto que ainda é visivelmente de alta qualidade, mas com custos controlados.
“Além disso, problemas logísticos e atrasos no envio forçaram os torrefadores a se tornarem mais criativos para garantir que a qualidade não caia e que os perfis de sabor sejam consistentes”, acrescenta.
Daniel, entretanto, não acredita que os cafés de origem única estejam sendo esquecidos. “A maior mudança na indústria do café é que os torrefadores estão encontrando novas maneiras de desenvolver e comercializar seus blends”, diz.
Por exemplo, em vez de vender micro ou nano lotes premium como cafés de edição mais exclusiva ou limitada, esta tendência mostra haver o escopo de misturá-los com outros cafés.
Isso também pode ser benéfico para os produtores, pois a qualidade do café pode flutuar como resultado de vários fatores – incluindo clima imprevisível e um aumento de pragas e doenças. “Blends especiais podem ser versáteis”, diz Daniel. “Eles podem ser usados para café espresso ou filtro e ainda têm o mesmo nível de qualidade que as origens únicas.”
O futuro
Considerando como os blends de café especiais recentemente aumentaram em popularidade, parece haver mais crescimento por vir. Ao menos até que o preço do café ou os custos de logísticos caiam.
Daniel diz que o sucesso dos blends premium se deve mais a torrefadores e comerciantes de café verde, do que aos produtores. “É impossível para os pequenos agricultores cultivarem volumes mais altos de café para blends”, acrescenta.
Segundo ele, isso é ainda mais nítido quando a maioria dos produtores na Colômbia cultivam café em dois ou três hectares. “A responsabilidade de criar e comercializar blends especiais que sejam rastreáveis e consistentes recai sobre exportadores, associações, cooperativas e torrefadores”, finaliza.
Philip diz que os torrefadores precisarão se adaptar a quaisquer tendências futuras no mercado de café, bem como às flutuações de mercado, que podem afetar a composição de seus blends. No entanto, ele acrescenta que a demanda por misturas especiais e origens únicas provavelmente continuará aumentando. “Os dois não são contraditórios, mas complementares. Os consumidores nem sempre precisam decidir entre os dois”, conclui.
Embora seja claro que os blends de cafés especiais estejam se tornando mais populares, é seguro dizer que as origens únicas certamente também têm seu lugar na indústria do café especial.
No entanto, embora tenham dominado o setor por muitos anos, uma recente recessão econômica e outras questões da cadeia de suprimentos deixaram claro que eles podem realmente existir em harmonia.
Mas se os blends especiais se tornarão ou não mais um foco nos próximos anos, ainda veremos.
Gostou? Em seguida, leia nosso artigo sobre se os torrefadores de café devem adicionar robusta às misturas se os preços da arábica aumentarem.
PDG Brasil
Traduzido por Daniela Melfi
Quer ler mais artigos como este? Assine a nossa newsletter!