Em busca de experiências: Como as cafeterias se transformaram em um refúgio para os clientes
A experiência de visitar cafeterias de café especial tem se tornado um hábito cada vez mais comum entre os brasileiros, principalmente nas grandes metrópoles. Basta abrir as redes sociais para se deparar com diversas postagens de amigos, desconhecidos e influenciadores curtindo um cafezinho ou um brunch. Mas o que torna esses lugares tão atraentes para o público?
Para entender mais sobre o assunto e responder a esse questionamento, o PDG Brasil ouviu os fundadores de duas movimentadas cafeterias de Minas Gerais e São Paulo. Também foi entrevistado um casal de coffee lovers, que adora sair para tomar café nos momentos de lazer.
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Um novo conceito
O OOP Café foi inaugurado em julho de 2016 em Belo Horizonte (MG). Para atrair e ambientar os futuros clientes, Tiago Damasceno começou a movimentar os perfis nas redes sociais antes mesmo da abertura da loja. Entendendo que parte do público viria dos escritórios, ele e a sócia, Adriene Cobra, decidiram oferecer um serviço inovador na capital mineira.
A cafeteria “foi planejada como um espaço de descompressão na Savassi. Um local imersivo pra você abrir a porta, entrar naquele lugar e ser rodeado por uma nova atmosfera”, contou Damasceno. A ideia era oferecer uma oportunidade de escapismo sem a correria e as preocupações do dia a dia. Para isso, a dupla passou a oferecer uma experiência multissensorial, incluindo aspectos visuais e sonoros.
Segundo ele, a OOP também foi construída como uma crítica ao mercado, que sofria com a distorção do barismo, afetado pela postura arrogante de alguns profissionais. “Desde o começo existe uma conversa de que o café não é rei na casa. Aqui, o grau de importância é dividido igualmente entre café, qualidade de café e atendimento”, revelou o empresário.
Com o sucesso da empreitada, uma segunda unidade foi aberta em uma das galerias de arte do Instituto Inhotim, em Brumadinho, em março de 2019. Para reproduzir a experiência oferecida na matriz, houve a reprodução de pontos de contato e da conhecida hospitalidade. Já a qualidade do menu é mantida por meio de produtos de fornecedores locais.
A pandemia forçou uma remodelação na primeira unidade da cafeteria, que passou a contar com lugares externos e o conceito de Praça da OOP. Porém, a experiência antes imersiva acabou prejudicada pela dura realidade das ruas. Com a melhora da crise sanitária, os clientes começaram a pedir o retorno do atendimento na área interna.
Em fevereiro deste ano, Adriene e Tiago iniciaram o projeto de ampliação do salão com a integração com o imóvel vizinho. O novo espaço foi finalizado para receber o público seis meses depois, em agosto. A clientela também foi beneficiada pela inauguração de uma cozinha. Já a torrefação foi transferida para outro local.
A iniciativa ampliou a capacidade de 30 para 80 lugares, reduzindo o tempo de espera por uma mesa. O tíquete médio dos clientes também melhorou por conta do aumento do tempo de permanência na casa e pela ampliação do cardápio com opções mais elaboradas.
O casal coffee lover
Rafael Café Sforcin carrega uma das grandes paixões no sobrenome. Por coincidência ou não, a família dele sempre teve o hábito de confraternizar tomando um cafezinho em vez de se reunir em grandes almoços. O costume acabou caindo nas graças da mulher, Branca Mecenero Sforcin. Desde então, passaram a visitar diversas cafeterias.
O hobby se intensificou ainda mais quando o casal de São Caetano do Sul, no Grande ABC, conheceu o café especial em 2010 e começou a frequentar locais como o Suplicy Cafés Especiais e o Octavio Café. Os dois ainda conheceram o Coffee Lab depois que um primo de Rafael fez um curso de barista no local e foi lá que eles tiveram grandes experiências.
Na época, a cafeteria comandada por Isabela Raposeiras oferecia um atendimento intimista e didático para a clientela, que ainda era bastante leiga sobre o assunto [atualmente, a cafeteria já conta com um público mais maduro em relação ao tema]. “Tinha essa questão de divulgar e explicar mesmo sobre o café especial”, relembram os coffee lovers. A partir daí, os Sforcin passaram a procurar estabelecimentos com cardápio diferenciado e ambiente aconchegante, muitas vezes na companhia de Elizabete e Sérgio, pais de Rafael.
Nos últimos anos, com o surgimento da Covid-19, Branca e o marido passaram a ser mais seletivos no momento da escolha das cafeterias. Com a redução do poder de compra, eles começaram a buscar lugares com melhor custo-benefício, que oferecem cafés e comidinhas de qualidade a um preço justo. Os dois também passaram a utilizar o serviço de delivery de estabelecimentos próximos, como O Segredo da Felicidade Coffee.
Experiência de outro mundo
O Astronauta Café é uma cafeteria da zona sul de São Paulo que nasceu na internet em junho de 2018. Cinthia Bracco inovou ao compartilhar com os seguidores do Instagram todas as etapas que ocorreram antes da inauguração da cafeteria em novembro do mesmo ano. Ela mostrou a reforma, as dificuldades e os desafios que surgiram ao longo do processo. A transparência se tornou uma característica relevante do negócio.
Pensando na experiência dos clientes, o tema espacial está presente em praticamente todos os pontos de contato, incluindo os perfis nas redes sociais, os itens do cardápio, as louças e os ambientes do imóvel, como a fachada, os salões e os banheiros. “No plano de negócios, tenho uma parte dedicada ao branding e decidi personificar a marca”, revelou a publicitária.
Vegana há 20 anos, Cinthia decidiu atender a um nicho pouco explorado pelas cafeterias. O Astronauta se tornou um queridinho entre os adeptos do veganismo por não oferecer nenhum produto de origem animal. Para superar a resistência de alguns consumidores, ela elegeu a qualidade dos alimentos e bebidas como um dos pilares do negócio. “Assim, a pessoa vem, come um bolo e percebe que tanto faz comer comer um produto vegano ou não-vegano”, reforçou a idealizadora.
Para garantir o conforto e o sentimento de acolhimento, os cômodos da antiga casa foram mantidos nos mesmos locais, como a sala de estar, a sala de jantar, a cozinha, o lavabo e o quintal. A lojinha com pacotes de café, utensílios, métodos, canecas, chás, geleias, camisetas e itens de decoração foi instalada ao lado da fila do caixa para reduzir o impacto da espera.
O atendimento é outra grande preocupação da fundadora. Os colaboradores passam por capacitação e supervisão constante, incluindo sessões de cupping e visitas aos produtores. A ideia é que eles estejam motivados e capacitados para atender bem ao público e realizar as entregas com padrão e qualidade.
Com foco na empatia e respeito mútuo, o Astronauta lida com as ocorrências de maneira amistosa e diplomática. “A gente sempre se mostrou muito aberto a receber as críticas”, afirmou a empresária. Assim, questões envolvendo o uso de leite vegetal, a entrada de animais na área interna e o acesso ao menu através do QR Code foram contornadas de maneira favorável e positiva para o estabelecimento.
Para estimular o senso de comunidade, a cafeteria atua em parceria com outros negócios locais dos mais diversos segmentos. Entre as ações realizadas está a distribuição de vouchers de espresso grátis. Na época da Páscoa, Cinthia também promove uma caça aos ovos pelas ruas do bairro com vales que podem ser trocados por produtos de consumo imediato ou canecas.
Encantando a clientela
Oferecer experiências diferenciadas aos consumidores se tornou algo essencial para o sucesso das cafeterias. É importante que cada negócio avalie as características de seu público e enxergue as oportunidades de negócio.
Na OOP, por exemplo, o calendário de workshops foi mantido apenas entre 2017 e 2019. Já no Astronauta, as oficinas envolvendo sensorial seguem com alta demanda até hoje.
Fidelizar e manter a clientela também não deve sair do foco dos empresários. Branca e Rafael Sforcin sentem falta do atendimento mais próximo que era oferecido no passado. Outra questão levantada pelo casal coffee lover é a falta de iniciativas voltadas para os consumidores de café especial e apoiadores mais antigos. Sobre o assunto, Cinthia Bracco disse: “Li uma pesquisa que indica que 70% da experiência do cliente têm a ver com como ele se sente tratado”.
Os defensores das marcas foram essenciais para que os negócios não fechassem durante a pandemia. Muitas campanhas de financiamento coletivo foram criadas pelos próprios clientes. Sobre as cortesias de café, a fundadora do Astronauta garante que “praticar o marketing de guerrilha não custa muito. A gente tem um planejamento que inclui ações interessantes que, com criatividade, exigem pouco investimento”, conclui a barista publicitária.
Ou seja, é possível encantar o público com iniciativas de baixo custo que priorizem a experiência e, com isso, fazer diferença na vida dos apreciadores e das apreciadoras de café.
Créditos: Acervo pessoal dos entrevistados, Bárbara Barros, Cinthia Bracco e divulgação das cafeterias.
PDG Brasil
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