23 de outubro de 2023

O barato da cafeína: por que beber muito café causa agitação?

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Mãos trêmulas, batimentos cardíacos acelerados e uma sensação subjacente de ansiedade. Esses efeitos são bastante comuns para quem costuma tomar grandes quantidades de café. E geralmente são o resultado de níveis elevados de cafeína no corpo – daí o termo barato de cafeína.

Para muitos profissionais da indústria (e até mesmo consumidores), beber e degustar café faz parte do dia a dia, tornando o hábito um tanto inevitável. No entanto, muitas pessoas percebem ser necessário reduzir a ingestão de cafeína, principalmente quem é muito sensível à substância.

Então, como a cafeína causa essas reações fisiológicas? E existem maneiras de mitigar os efeitos do alto consumo? Para descobrir, conversei com o Dr. Samo Smrke, da Universidade de Ciências Aplicadas de Zurique, e com a Dra. Angela Zivkovic, da Universidade da Califórnia, Davis.   Continue lendo para saber mais sobre por que beber muito café pode causar esse barato de cafeína.

Você também pode gostar do nosso artigo sobre a relação entre o consumo excessivo de café e o surgimento de problemas estomacais.

Café coado sendo servido numa xícara, com uma pessoa usando camisa vermelha ao fundo -- barato da cafeína

Além da agitação, quais são os efeitos da cafeína no corpo?

A cafeína é um estimulante natural que pode ser encontrado em vários alimentos. Café, chá preto e verde, cacau, guaraná e erva-mate estão entre eles. Embora o consumo da cafeína seja conhecido por melhorar várias funções cognitivas e físicas, muitas pessoas optam por limitar sua ingestão por diversos motivos.

Segundo a Food and Drug Administration dos EUA, a cafeína pode fazer parte de uma dieta saudável para a maioria, mas o consumo em excesso acaba sendo prejudicial para algumas pessoas. Essencialmente, isso depende de uma ampla gama de fatores, que incluem:

  • peso;
  • gravidez
  • tomar certos medicamentos;
  • sensibilidades individuais ou alergias à cafeína.

Para adultos considerados saudáveis, a FDA afirma que 400 mg de cafeína por dia é uma quantidade segura. Isso equivale aproximadamente a quatro ou cinco xícaras de café.

No entanto, a quantidade média de cafeína nas bebidas de café pode variar um pouco. Por exemplo, um estudo de 2023 do grupo de consumidores Which? descobriu que existem “enormes diferenças” no teor de cafeína nas principais bebidas das redes de café do Reino Unido. Isso estava relacionado ao número de doses de café espresso na bebida, bem como à quantidade de robusta.

Por que as pessoas consomem cafeína?

O Dr. Samo Smrke é o chefe da ZHAW School of Life Sciences and Facility Management Section para o Coffee Competence Centre and Analytical Technologies. Segundo ele, a cafeína é uma molécula solúvel em água e em lipídios. “Isso significa que ele é absorvido por diferentes sistemas em nossos corpos. Estudos descobriram que existem mecanismos interativos complexos e vias metabólicas para a cafeína no corpo” , dize ele. 

Quando consumida com moderação, ele diz que a cafeína pode melhorar o estado de alerta, a atenção e o desempenho físico. Samo explica que isso ocorre porque a cafeína inicia a liberação de dopamina, um neurotransmissor que pode aumentar a disposição e a motivação, no cérebro. Ele ainda acrescenta que, com o tempo, a substância também pode aumentar a taxa metabólica (e, assim, apoiar a perda de peso), aumentar a memória de longo prazo e ajudar na desintoxicação do fígado.

O café como aliado da saúde

Há também evidências que sugerem que níveis seguros de consumo de cafeína podem reduzir o risco de desenvolver certas doenças. Entre essas doenças estão o diabete tipo 2, acidentes vasculares cerebrais e doenças hepáticas e cardiovasculares, bem como o  Alzheimer e a doença de Parkinson. No entanto, isso depende muito da idade e do sexo biológico. Além disso, mais pesquisas clínicas são necessárias para melhor apoiar essas alegações.

A Dra. Angela Zivkovic é professora associada do Departamento de Nutrição da UC Davis, bem como membro do corpo docente do UC Davis Coffee Center. Ela explica que as moléculas de cafeína viajam por diferentes mecanismos no corpo. Por exemplo, os compostos que resultam em um estado de alerta maior são processados por uma via bioquímica. Os compostos que levam a um maior nível de ansiedade, por sua vez, são processados de forma diferente. Ela acrescenta que o café também contém outros compostos benefícios para a saúde, como antioxidantes e polifenois – mas novamente mais pesquisas são necessárias.

Analisando os efeitos negativos

Mesmo ao consumir cafeína dentro dos limites recomendados, Samo explica que ainda assim é possível sentir efeitos colaterais negativos. Por exemplo, o aumento na frequência cardíaca e na pressão arterial, além da liberação de ácido no estômago

Samo acrescenta que, para algumas pessoas, mesmo uma pequena quantidade da substância pode reduzir o controle das habilidades motoras, desencadear dores de cabeça ou tonturas e levar à insônia, além de piorar a irritabilidade, ansiedade ou depressão.

Como a cafeína é uma droga, níveis mais altos de consumo durante um tempo prolongado também podem resultar em aumento da dependência física e psicológica. No entanto, é importante notar que esses efeitos colaterais estão amplamente relacionados ao consumo regular de mais do que a quantidade diária recomendada.

Neste caso, Samo explica que a ingestão excessiva de cafeína – ou uma “overdose de cafeína” – pode ter efeitos nocivos em vários sistemas do corpo. Ele diz que altas taxas da substância no sistema nervoso central podem levar a confusão, delírio, dores de cabeça intensas e insônia. Algumas pessoas podem até experimentar flashes de luz, zumbidos ou sentir uma maior sensibilidade ao toque ou à dor. 

Os efeitos no sistema cardiovascular como aceleração nos batimentos cardíacos ou arritmia também são comuns. Além disso, o sistema muscular também pode experimentar espasmos, movimentos esporádicos e superextensão. Desconforto no sistema gástrico, por sua vez, podem incluir dor abdominal, náuseas e vômitos.

Por fim, cada indivíduo experimentará esses efeitos colaterais negativos, incluindo “agitação” da cafeína, de forma diferente. Certos fatores, como idade e sexo biológico, também desempenham um papel importante.

Copo de vidro com dose de espresso

Então, o que é o barato de cafeína?

Se alguém está agitado, geralmente significa que se sente nervoso e não consegue relaxar. Em alguns casos, beber muito café pode resultar em sintomas semelhantes. Angela explica que os efeitos da cafeína resultam da metilxantina – uma substância que ocorre naturalmente nos alimentos. A cafeína é a principal metilxantina do café, com efeitos estimulantes em nosso sistema nervoso central. 

Quando bebemos café, a metilxantina se liga aos receptores de adenosina, um composto orgânico encontrado nas células humanas que ajuda a ditar nossos níveis de energia. É por isso que a cafeína faz a gente se sentir mais alerta a qualquer hora do dia. No entanto, a adenosina continua sendo produzida pelo corpo ao longo do tempo, mesmo após a ingestão da cafeína.

Angela diz que, uma vez que nossos corpos metabolizam e removem a cafeína, a adenosina acumulada se liga aos receptores, causando cansaço súbito. Esse cansaço também é chamado de “queda de cafeína”, que pode atrapalhar o cliclo circadiano e levar a padrões irregulares de sono. Nos piores casos, isso pode até causar insônia.

A reação de lutar ou fugir

Ao analisar especificamente o barato da cafeína, Angela me diz que o consumo da substância pode aumentar o nível de cortisol no corpo. Isso pode resultar em mais comportamentos relacionados ao estresse.  “Você pode começar a ficar suado, seu coração bater mais rápido e surgir uma sensação de nervosismo, porque seu corpo recebeu um sinal de que há algum tipo de perigo por perto”, ela conta.

Além desses sintomas, as artérias também se contraem. Isso força o sangue a se afastar dos órgãos centrais para as extremidades do corpo (como braços e pernas) – essencialmente uma resposta de “luta ou fuga”. Também pode haver um aumento da pressão arterial na cabeça, causando dores de cabeça recorrentes e problemas de visão. Angela acrescenta ainda que a resposta física de “luta ou fuga” causada pela cafeína também pode resultar em mais estresse e desconforto mental.

Diferença na sensibilidade de cada pessoa

Dado que os limiares de cafeína das pessoas podem variar muito, há algumas diferenças na forma como elas experimentam seus efeitos. “Existem diferenças genéticas entre pessoas. Nelas, se incluem as enzimas que quebram a cafeína”, explica Angela. 

Por exemplo, no fígado estão as enzimas do citocromo P450. Elas são as primeiras a converter a cafeína em outras substâncias. “A atividade dessas enzimas do citocromo P450 pode variar muito entre pessoas diferentes”, acrescenta. Em essência, isso significa que algumas pessoas metabolizam o café mais lentamente do que outras.

“Para as pessoas que metabolizam a cafeína mais lentamente, beber mais de duas xícaras de café por dia está associado a um maior risco de ataques cardíacos”, diz Angela. Ela explica ainda que a atividade das enzimas do citocromo P450 é afetada pela dieta e pelo ambiente de uma pessoa. Além disso, o peso e o tipo corporal, bem como a quantidade de alimentos consumidos, influenciam a taxa de metabolização da substância.

“A duração da permanência da cafeína no sistema, bem como a intensidade com que ela afeta alguém, varia tanto que é difícil concluir a quantidade dela que pode fazer alguém se sentir agitado”, diz Angela. Cerca de 30 a 60 minutos após o consumo, a cafeína atinge seu nível máximo na corrente sanguínea. “O tempo médio que leva para metabolizar cerca de metade da cafeína no corpo é de cerca de cinco horas”, diz Samo. “No entanto, o tempo pode variar entre 1,5 a 9,5 horas, dependendo do indivíduo.”

Barista segurando uma jarra com café coado

Como reduzir os efeitos da cafeína?

De longe, a maneira mais fácil de evitar os sintomas negativos da cafeína é consumir quantidades moderadas de café. “O consumo contínuo de cafeína acima do limite diário recomendado pode causar sérios problemas de saúde”, explica Samo. Ele acrescenta ainda que beber mais arábica pode ajudar a reduzir o consumo de cafeína. Isso ocorre porque contém cerca de metade do teor de cafeína do robusta. 

Embora seja importante notar que a quantidade de cafeína por porção varia dependendo da dose, Samo estima que 1 g de arábica contém cerca de 10 mg de cafeína, com 1 g de robusta, portanto, contendo 20 mg de cafeína. Ele acrescenta que isso pode significar que os níveis de cafeína podem variar de “70 mg, para um café espresso italiano tradicional usando arábica, a 400 mg para uma dose dupla de robusta“.

Além disso, o café descafeinado também é uma opção. O café descafeinado geralmente contém entre 2 mg e 15 mg de cafeína por porção de 236 ml. Naturalmente, variedades com baixo teor de cafeína, como Laurina e Aramosa, também estão se tornando mais populares.

Comida e água

Também é recomendado evitar beber café com o estômago vazio. Isso ajuda a retardar a absorção da cafeína, além de reduzir a chance de sofrer de refluxo ácido.  

Embora alguns afirmem que comer certos alimentos (principalmente bananas) pode ajudar a prevenir o barato da cafeína, há poucas evidências científicas para fundamentar essas alegações. Se você consumir muita cafeína, a melhor solução é beber muita água e abster-se de qualquer atividade física por algumas horas para permitir que seu sistema nervoso se acalme.

“Muitas pessoas gostam de beber café, e isso tem uma série de benefícios para elas”, diz Angela. “Estudos relatam efeitos diferentes para diferentes demografias de pessoas, mas o que funciona melhor para você é o mais importante.”

Copo com dose de espresso sob o grupo de extração de uma máquina -- barato da cafeína

Em resumo, consumir regularmente cafeína acima do limite diário recomendado certamente pode resultar em efeitos colaterais negativos. No entanto, embora possa variar de pessoa para pessoa, o consumo moderado de café provavelmente não causará “nervosismo” da cafeína ou problemas semelhantes.

Finalmente, ao adotar uma abordagem mais consciente de quando e com que frequência você bebe café, você pode reduzir a probabilidade de possíveis problemas estomacais.

Gostou? Em seguida, leia nosso artigo sobre café, saúde e bem-estar.

Tradução: Daniela Melfi. 

PDG Brasil

Isenção de responsabilidade: esta não é uma publicação médica. Nenhum material neste artigo se destina a substituir o aconselhamento médico profissional, um diagnóstico ou um tratamento. Procure sempre aconselhamento médico junto de um profissional de saúde qualificado.

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