A arte de fotografar café. Histórias de quem se dedica a registrar a beleza e as pessoas do café no Brasil
Um ditado popular diz que “uma imagem vale mais que mil palavras” e no universo do café especial isso não é diferente. Boas fotos se tornaram essenciais para todos os setores que fazem parte deste mercado. Especialistas em fotografar café, seja para se expressar, para criar portfólio, para alimentar as redes sociais ou para simplesmente registrar um momento, o trabalho dos fotógrafos de café tem sido cada vez mais procurado e valorizado.
Por conta disso, o PDG Brasil entrevistou alguns profissionais que conseguiram unir duas paixões: a fotografia e o café. Venha descobrir mais sobre essas pessoas de diferentes perfis e realidades que têm um importante papel, mas muitas vezes acabam ficando restritas apenas aos bastidores.
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Crédito: Tony Chen.
Uma história que começou na Ásia
Chen Chia Chin, cujo apelido é Tony, nasceu em 1979 em uma próspera família de Taiwan. O pai dele tinha uma fábrica de próteses com 60 funcionários. Com uma boa situação financeira, o empresário passou a ter a fotografia como hobby. “Eu tenho muitas fotos de quando era criança. Na época ninguém tinha, e os álbuns se tornaram a maior lembrança da minha infância”, afirma Chen. Após decidir se aposentar precocemente, o pai de Chen decidiu se mudar para o Brasil. Ele começou a buscar novos desafios ao perceber que o filho, na época um adolescente de 15 anos, levava uma vida muito confortável.
Porém, a vinda ao país foi muito mais complicada do que o previsto, e os primeiros três anos foram de muita luta para a família de Chia Chin. Assim, o jovem acomodado acabou se transformando em um rapaz maduro e responsável. Apesar da dificuldade linguística, ele entrou para o curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo. Como não conseguia se comunicar bem em português, Tony passou a usar a fotografia como forma de expressão.
Crédito: Silvana Mello Akita.
Conexão São Paulo X Pernambuco
Silvana Mello Akita, de 43 anos, é filha de um economista e uma dona de casa. Nascida em Osasco, ela se mudou com a família para Recife, com cerca de dez anos de idade. Após o divórcio dos pais no início da adolescência, Sill, como é mais conhecida, viveu idas e vindas entre as duas cidades. O patriarca se tornou dono de um bar na capital pernambucana, enquanto a matriarca passou a morar com a filha mais velha na região metropolitana de São Paulo.
Revoltada com a separação e a distância dos amigos, Silvana chegou a abandonar os estudos por dois anos e começou a trabalhar aos 14 em eventos de um shopping da região de Jaboatão dos Guararapes. Aos 23, ela voltou definitivamente para a região Sudeste por conta de uma promoção envolvendo a extinta Transbrasil. Como a companhia aérea faliu durante a viagem, não conseguiu embarcar de volta para Recife.
“Meu pai sempre fotografou e gostava tirar fotos de mim e das minhas irmãs”, relembra Sill. Quando a câmera estava sem filme, ela aproveitava para brincar de fazer ensaios com as bonecas. Já adolescente, Silvana passou a ter o próprio equipamento ao encontrar uma máquina analógica em um ônibus na volta do trabalho. Depois de se casar, ela se encantou com um casal de amigos estrangeiros do marido que fotografa por amor e roda o mundo para registrar a vida selvagem.
Crédito: Tony Chen.
Conhecendo o café especial
Trabalhando em um escritório de arquitetura na Vila Madalena, Tony acabou conhecendo o Coffee Lab em 2012. “Me apaixonei pelo ritual do cappuccino. Logo que voltei para o trabalho eu perguntei para o meu chefe se poderia tirar dois dias para fazer um workshop de café caseiro para servir melhor os clientes”, revela Chen. Após o treinamento, ele já se inscreveu para o curso de barismo com Regina Machado e Renato Gutierres.
Algo semelhante aconteceu com Silvana. Apaixonada por vinhos, ela descobriu que tinha o sensorial aguçado ao se tornar enóloga. Ao comprar uma máquina Nespresso em uma liquidação, Sill começou a tomar gosto por café e logo teve contato com a categoria especial. Ávida por conhecimento, ela se tornou barista e mestre de torra com as formações oferecidas no Museu do Café, em Santos.
Crédito: Tony Chen.
A fotografia e o café
Sem conseguir vaga para um campeonato de Aeropress sediado pela FAF em 2015, Chia Chin decidiu fazer a cobertura do evento de maneira voluntária. A produção de um documentário sobre a competição foi o pontapé inicial para que ele começasse a ser visto como uma referência em fotografia no setor. Depois de se tornar o primeiro barista do Isso É Café, Chen inventou o método brasileiro Coador Z e passou a escrever para uma publicação especializada de Taiwan.
Investindo em equipamentos de ponta, Tony produz todo o material que ilustra as matérias, incluindo fotos de cafeterias, torrefações, eventos nacionais e internacionais, como a Semana Internacional do Café, em Belo Horizonte, e produtores de café. Ele também passou a ser procurado para fotografar produtos de empresas do ramo de alimentação e bebidas.
Crédito: Silvana Mello Akita.
Defensora da fotografia intuitiva, Sill passou a carregar a câmera fotográfica profissional para tirar fotos dos cafés que tomava e dos cuppings que participava. Com o passar do tempo, começou a cobrir eventos, como a Copa São Paulo Hario V60 e a SIC, além de ir para o campo e também registrar a passagem do projeto Oficina do Barista por Pernambuco.
Silvana acabou convidada pelo coordenador Paulo Gabriel para ser fotógrafa do projeto social Fazedores de Café. “Na época, não pesquisei nada e só fui tirar foto. Onde eles iam, eu ia. Então, lançaram um vídeo em que o Paulinho contava a história dele. Aí eu caí no choro e passei a ter muito orgulho de ser voluntária da ação do Sofá Café, que considero o trabalho mais importante da minha vida”, confidencia. Sem deixar o barismo de lado, ela ainda se tornou campeã da Copa Koar 2021.
Crédito: Txai Ilg.
Surge um novo talento
Txai Leonelli Ilg pode ser considerado um prodígio na fotografia de café especial. “Nasci e cresci em São Lourenço, sul de Minas Gerais. Meus pais me criaram de uma forma um pouco diferente. Meu pai é ceramista e minha mãe é professora de ioga. Então, acho que fui criado de uma forma um pouco mais artística”, conta o rapaz de 21 anos. Mesmo vivendo em um ambiente não tradicional, Txai chegou a cogitar seguir carreira na área de exatas por influência dos professores do colégio.
Porém, o jovem mudou de ideia após comprar a primeira câmera profissional ainda na adolescência. Sem nenhuma formação formal, ele aprendeu a fotografar com tutoriais na internet, cursos online, livros e dicas dos amigos. Empolgado com a nova carreira, Txai chegou a trabalhar em uma hamburgueria para juntar dinheiro para adquirir mais equipamentos.
Crédito: Txai Ilg.
Enquanto trabalhava fazendo ensaios e coberturas de shows, eventos e festas, Ilg teve o primeiro contato com o café especial na Unique Cafés, onde participou de diversos workshops com Gabriel Guimarães. Por viver em uma cidade pequena e ser um cliente frequente da principal cafeteria e torrefação da região, o fotógrafo acabou indicado para trabalhar na área de marketing e social media da Carmo Coffees em março de 2020.
Txai se tornou responsável por toda a comunicação interna e externa da empresa, além de produzir conteúdos para as redes sociais implementando diversas inovações. Com um contrato de exclusividade para trabalhos relacionados ao café, ele também trabalhou na renovação do catálogo de imagens dos produtores parceiros.
Crédito: Érico Hiller.
Fotografar café especial
A fotografia é uma ferramenta essencial para o mundo do café especial. Os registros são importantes para que a história seja registrada, preservada e repassada para as futuras gerações. E também para que os consumidores tenham mais acesso ao universo do café de qualidade. Por conta disso, os trabalhos de profissionais, como o documentarista Érico Hiller, devem ser contemplados e enaltecidos. Premiado fotógrafo documental, que viaja o mundo todo em busca de belas histórias visuais, Érico é autor dos livros “Emergentes” (2008), “Ameaçados” (2012) e “A Jornada do Rinoceronte” (2016) e de “Água”, lançado em 2021. Apreciador de café, Érico fotografa já há alguns anos fazendas de café especial, como a FAF e a Fazenda Ninho D´Águia, e foi um dos jurados convidados do Concurso A Minha Colheita PDG Brasil.
Crédito: Érico Hiller.
Levando em consideração o mercado, as boas fotos se tornaram ainda mais necessárias para atrair os consumidores durante a pandemia do novo coronavírus. “No ano de 2020, como os clientes não podiam visitar a gente, nós tínhamos que levar a fazenda até eles. Essa foi a principal importância da fotografia e da criação de conteúdo nesse período”, destaca Txai. A premissa também pode ser aplicada no varejo, onde o delivery e as entregas se tornaram uma importante fonte de faturamento para torrefações, cafeterias e lojas especializadas.
Ao comentar o trabalho de um fotógrafo de café especial, Tony afirmou que é importante que o profissional saiba seu próprio índice de aproveitamento. “Tenho a minha porcentagem de sucesso. Na cafeteria, gosto de registrar o momento e consigo acertar mais. Já nos eventos e competições, tenho de 15 a 20% de fotos boas”, conta Chen. Para ele também é importante oferecer planos de equipamentos de acordo com a necessidade do cliente, além de sempre antenado com as novas tendências. A questão da inovação também foi citada por Ilg.
Crédito: Txai Ilg.
Já Silvana diz que o amor a motiva a fotografar. “Meu objetivo é conseguir entregar para os outros o que eu vi neles e emocioná-los com meu ponto de vista”, conta. Ela também diz que é importante registrar a verdadeira realidade do café especial para educar os consumidores, sem mostrar apenas o lado romantizado da cadeia. Em geral, a fotografia de café especial acaba exigindo do profissional conhecimentos profundos sobre o assunto.
Crédito: Silvana Mello Akita.
Chen, que acabou fotografado por Sill sem eles nem se conhecerem, espera que no futuro exista uma interação maior entre os fotógrafos de café especial e que eles sejam mais reconhecidos. “Eu comecei a perceber que o fotógrafo quase não tem fotos de si mesmo, porque ele tira foto de todo mundo com a câmera, e ninguém tira foto do fotógrafo”, brincou Tony.
PDG Brasil
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