4 de dezembro de 2023

Existe um padrão para estabelecer um perfil de torra?

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Qualquer torrefador dirá que cada café é diferente. Em se tratando de diferentes origens, variedades, métodos de processamento ou densidades dos grãos, existem muitos fatores que influenciam como você torra o café. Além disso, é responsabilidade do torrador destacar as melhores características de cada café principalmente aquelas que o tornam mais singular.  Portanto, os torrefadores devem desenvolver diferentes perfis de torra para conseguir os melhores resultados.

Desta forma, cabe perguntarmos se existe uma abordagem universal para o perfil de torra que os profissionais de café podem seguir – e depois ajustar de acordo com cada café? Ou é melhor adotar uma abordagem diferente para cada grão? Falei com Marcus Young, Vice-Presidente Executivo de Café da goodboybob, e Fabio Ferreira, sócio da Notes Coffee, para saber mais.

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Grãos de café sendo despejados numa tigela sobre mesa de cupping

O que é um perfil de torra?

Na indústria do café, muitas vezes falamos sobre perfis claros, médios e escuros de torra – mas o que eles realmente significam? O Sweet Maria ‘s define um perfil de torra como “o que aconteceu durante a torra e quais ajustes foram feitos para afetar o resultado”. Essencialmente, é um conjunto de dados coletados durante a torra. Esses dados são exibidos em um gráfico (ou curva de torra) para poderem ser replicados – semelhante a uma receita culinária.

Podemos então definir o perfil de torra como o processo de manipulação de variáveis, como o tempo e a temperatura, para obter um bom equilíbrio de acidez, doçura, amargor e textura para um café específico. Marcus é o vice-presidente executivo de café da goodboybob, uma torrefadora de café especial vencedora do Golden Bean na Califórnia, EUA. Ele diz que uma grande parte de aprender a desenvolver perfis de torra é saborear muitos cafés diferentes. “Para ser um ótimo torrador, primeiro você precisa ser um ótimo cupper”, afirma. 

A degustação é uma prática da indústria realizada por produtores, compradores de café verde e torrefadores em todo o mundo para saborear o café. Ele segue um conjunto padrão de protocolos de preparo, que os Q graders usam para avaliar e pontuar perfis sensoriais e qualidade. Provar regularmente uma variedade de cafés – incluindo diferentes origens, altitudes, métodos de processamento e variedades – significa que os torrefadores conseguem entender melhor a vasta gama de sabores do café. Por sua vez, o processo de desenvolvimento e personalização de perfis de torra torna-se mais fácil.

Por que ele é tão importante?

Como estabelecemos, cada café é diferente. Por exemplo, um café cultivado em um clima úmido em uma elevação mais baixa reagirá de forma diferente quando torrado em comparação com outro café cultivado em uma elevação mais alta em condições ambientais mais secas. Mas o clima e a altitude são apenas dois fatores entre muitos que afetam o perfil de torra. 

Tomemos a origem, por exemplo. Com a maioria dos cafés quenianos tendo uma acidez muito mais brilhante e proeminente do que os cafés cultivados em outros países, isso precisa ser levado em conta ao desenvolver um perfil de torra. Da mesma forma, você também precisa torrar os cafés lavados de forma diferente dos cafés naturais, mel e processados experimentalmente. Considerando isso, não há uma abordagem única para a criação de perfis de torra. Mas o que os torrefadores podem fazer é seguir as etapas e orientações gerais para encontrar o perfil ideal para um determinado café.

Torrefador analisando o perfil de torra de um lote

Por onde começar com o perfil de torra?

Para torrefadores mais experientes, muitas vezes é mais fácil desenvolver um perfil de torra inicial para um café que eles nunca compraram antes. Fabio fundou a torrefação britânica Notes Coffee em 2008, junto com Robert Robinson. Ele diz que, quando compra um café novo, analisa perfis de torra anteriores para encontrar um bom ponto de partida. “Eu uso esse perfil de torra como minha linha de base para que eu não torre o novo café às cegas”. 

Isso obviamente ajuda a aumentar as chances de desenvolver um bom perfil de torra na primeira vez – e depois ajustar para aprimorar os resultados. No entanto, é improvável que os torrefadores mais novos tenham um catálogo de perfis de torra tão grande quanto os mais experientes. Por sua vez, eles precisam considerar vários atributos do café e construir um perfil de torra a partir daí.

Para ajudar no processo, Fábio e Marcus recomendam comprar um café de uma colheita anterior do seu fornecedor. Os torrefadores menos experientes podem então usar este café mais barato para brincar com o perfil de torra e entender melhor como diferentes variáveis afetam o perfil sensorial geral.

Quais são os fatores mais importantes a se considerar?

Existem, é claro, muitas variáveis cruciais a serem levadas em consideração ao desenvolver um perfil de torra. “A densidade do grão é um fator essencial para eu entender como posso torrar um café específico”, diz Marcus. Por exemplo, você pode precisar torrar um café mais denso a uma temperatura mais alta, enquanto o café menos denso geralmente requer uma temperatura de queda mais baixa e uma abordagem mais suave.

“Da mesma forma, o método de processamento também pode me dizer quanto calor devo aplicar”, acrescenta. “Um café lavado, eu torraria por um pouco mais de tempo, enquanto um café natural, eu reduziria o tempo total de torra para mostrar mais seus sabores.” Além da densidade do grão e do método de processamento, outras variáveis também são fundamentais para se ter em mente:

Provadora profissional de café avaliando uma amostra

Entendendo o que faz com que perfis de torra mudem

Embora o café verde seja um produto estável, ele passa a envelhecer com o tempo, geralmente cerca de um ano após a colheita. Por isso os torrefadores precisam estar cientes de como esse café mudará nos próximos meses. À medida que os grãos envelhecem, eles começam a perder acidez e doçura. Isso significa que, para evitar sabores indesejados, os torrefadores precisam criar perfis de torra de acordo.

“Com o café verde mais antigo, costumo torrar um pouco mais, o que lhe dá mais tempo para desenvolver os açúcares e compostos de sabor”, diz Marcus. “Por exemplo, se for uma torra de dez minutos quando o café estivesse fresco, eu aumentaria o tempo total de torra para 10,5 ou 11 minutos.”

Tanto o café verde quanto o torrado devem ser armazenados em condições ideais para preservar o frescor e a qualidade pelo maior tempo possível. Variáveis como temperatura, níveis de umidade e exposição à luz e oxigênio desempenham um grande papel nisso. Olhando especificamente para a temperatura, flutuações significativas farão com que o café verde envelheça muito mais rapidamente, o que afeta como o café será torrado. “Até mesmo o clima influenciará seu perfil de torra”, diz Fábio. 

Ele descreve uma época em que desenvolveu um perfil de torra para um café específico que deveria ter produzido bons resultados, mas sua curva estava “completamente fora dos gráficos”. “Estava muito frio naquele dia”, acrescenta ele, enfatizando que os torrefadores devem levar em conta as condições climáticas nos dias de produção em lote e como elas podem afetar o processo de torrefação.

Manter a consistência das variáveis

Certamente existem muitos outros fatores que podem influenciar um perfil de torra. No entanto, alguns deles estão mais relacionados à técnica do que à forma como o café está mudando ao longo do tempo. O tamanho do lote, por exemplo. Se você torrar com uma quantidade diferente de café todas as vezes, receberá inevitavelmente resultados diferentes a cada batelada. Isso ocorre porque o tamanho do lote afeta o fluxo de ar no torrador, o que interfere na distribuição de calor na máquina.

Da mesma forma, se você torrar o mesmo café em duas máquinas diferentes, os resultados provavelmente serão visivelmente diferentes. Como regra geral, mantenha variáveis como tamanho do lote e tipo de máquina o mais consistente possível. É muito mais fácil identificar outras variáveis-chave que precisam ser alteradas para obter o melhor perfil de torra possível.

torrefador durante apresentação

Dicas e conselhos para abordar o desenvolvimento do perfil de torra

É preciso muita prática para criar um perfil de torra ideal para um determinado café. No entanto, o processo não deve ser intimidante. Por fim, você sempre precisa considerar o sabor do café – e desenvolver um perfil que melhor destaque essas características. “A realidade é que há muitas maneiras de torrar ótimos cafés, e as pessoas devem ter a mente aberta para surpresas boas”, diz Marcus. 

Fábio, por sua vez, recomenda que os torrefadores não fiquem muito fixados na questão da curva de torra. “Às vezes é muito fácil não olhar para os números e como a curva de torra se desenvolveu, ou levar em consideração o café que você está usando. Você pode ter uma bela curva de torra, mas o café pode não ter um gosto tão bom quanto esperado”, ele diz.

Degustação de diferentes cafés

Como mencionado anteriormente, uma das maneiras mais eficazes de melhorar as habilidades de torrefação é experimentar o maior número possível de cafés diferentes. “Para quem começa a torrar, estude a xícara de café. É fácil treinar novos torrefadores para gerenciar máquinas e seguir perfis, mas você precisa saber como saborear o café. E às vezes essa é a parte mais difícil do trabalho. Um bom torrador precisa saber como aprimorar a acidez e a doçura do café – tudo se resume à degustação”, conclui Fábio.

Barista da cafeteria britânica Notes Coffee & Wine

Existe uma maneira universal de abordar o perfil de torra? Bem, sim e não. Com cada café sendo único – e mudando ao longo do tempo – os torrefadores precisam levar em consideração essas diferenças para obter os melhores resultados.

Uma coisa que os torrefadores sempre podem fazer para melhorar a consistência de seus perfis de torra, no entanto, é provar muitos cafés diferentes regularmente. Dessa forma, eles podem entender melhor a variedade de sabores do café – e como destacá-los o máximo possível.

Gostou? Em seguida, leia nosso artigo sobre como definir seu perfil de torra.

Créditos das fotos: Amit Dave, Daniel Mendoza, Elina Feofantova

Tradução: Daniela Melfi. 

PDG Brasil

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